terça-feira, 27 de julho de 2010

O que seu filho come na escola?


Publicado em 21/07/2010 Anna Simas - Gazeta do Povo

A escola também é responsável pelo desenvolvimento de bons e maus hábitos alimentares entre crianças e adolescentes, já que é lá que eles passam pelo menos um terço do dia. As cantinas escolares de Curitiba são, desde 2005, proibidas por lei de venderem comidas não saudáveis. Mas isso não garante que as crianças estejam livres de uma alimentação ruim dentro dos colégios.


Conheça os principais perigos que rondam o ambiente escolar e o que os pais devem fazer para evitar que os filhos façam parte do grupo de 22% das crianças que estão acima do peso no país, dado divulgado em junho por uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Café se toma em casa

Antes de ir para a aula o estudante deve tomar café da manhã em casa e em quantidade suficiente. Isso evita que chegue na escola e coma na cantina antes de entrar em sala. Se ele toma café correndo ou ingere qualquer coisa porque acordou atrasado, vai comer em excesso depois. A nutricionista da Escola Saint Michel, Marcela Laufert Caran, explica que é comum os jovens comerem em panificadoras ao redor do colégio antes de entrar. “Geralmente optam por fritura, massa, doce ou algum produto industrializado, o que faz muito mal para a saúde.”

Se o aluno vai com muita fome para a hora do intervalo, a tendência é comer uma quantidade acima da ideal.”Tem criança que não se contenta apenas com sua fruta ou salgado assado. Come os seus e ainda o de algum colega que não queira. Então, o que era para ser saudável passa a fazer mal pela grande quantidade”, conta Marcela.

O médico endocrinologista e membro da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica, Amélio Fernando de Godoy Matos, diz que o ideal é que antes de sair de casa pela manhã o jovem coma pelo menos uma fruta, uma fatia de pão integral, leite desnatado sem açúcar ou com adoçante, queijo e, no máximo duas vezes por semana, um ovo. “Se seguir isso ele vai sentir menos fome na hora do intervalo e ter pouca chance de ganhar peso.”

Perigo no bolso

Ao contrário das cantinas, lanchonete, banca de revistas, carrinho de doce e pipoca e panificadora ao redor das escolas não têm restrição à venda de alimentos. Para os menores, que ainda não ganham dinheiro dos pais, não há perigo, mas a partir dos 11 anos, quando a criança começa a ganhar dinheiro para o lanche, o acesso ao que faz mal é mais fácil.

Balas e chicletes são os principais vilões consumidos com aquela verba que sobra. Muitas crianças compram antes de entrar na escola ou na hora do intervalo. “Tem aluno que chega com o bolso cheio e distribui para todo mundo. Dentro de sala não é permitido comer porque o excesso de doce tira a concentração, mas na hora do recreio não tem como controlar”, conta Marcela.

Uma dica sugerida pela nutricionista da Escola Umbrella e do Hospital Evangélico de Curitiba, Lígia Maria Michelin, é que os pais conheçam os valores exatos do lanche da cantina e deem apenas o necessário para que não sobre para comprar outros alimentos. Se a escola permitir, podem também pagar por todo lanche do mês antecipado para que os filhos não precisem de dinheiro. Ela lembra que é fundamental que os pais não tenham no armário de casa qualquer guloseima, pois alguns jovens pegam escondido e levam para comer na escola.

Dentro da lancheira

O que vai dentro da lancheira pode contribuir para a alimentação saudável ou ser um veneno. O segundo caso acontece quando os pais não têm consciência dos malefícios ou, por falta de tempo, preferem os alimentos prontos e industrializados mais práticos, como bolachas recheadas, chocolates e salgadinhos.

A nutricionista do Colégio Dom Bosco, Andréa Lúcia Tetti, explica que o lanche preparado pela família deve seguir a mesma regra que as nutricionistas usam no cardápio da escola. “Tem de combinar uma proteína, como carne ou queijo, fibras, como frutas e verduras, e carboidratos, como o pão. Os doces não estão totalmente proibidos, mas devem ser consumidos em pequenas quantidades e não todos os dias da semana.”

Um dos problemas que os pais podem enfrentar quando mandam o lanche do filho é que ele se interesse pelo o que o colega come, o que é bastante comum entre as crianças. Mas, quando a maior parte delas leva comidas saudáveis, o exemplo passa a ser positivo e até estimula que o outro queira provar um alimento que nunca experimentou. “Tem aluno que só consome determinada fruta na escola, mas em casa não. Isso acontece porque ele vê que todos comem e quer fazer parte do grupo”, conta Lígia.

Desistir, nunca

Se a criança ou jovem experimentar pela primeira vez na escola algo saudável não significa que criará um hábito. É comum que ela continue com resistência ao alimento. Nessa hora a família precisa ter pulso firme, principalmente com os menores, e insistir sempre. A coordenadora da educação infantil da Escola Umbrella, Anna Carolina Jordan, sugere que os pais tentem oferecer o alimento pelo menos dez vezes e em dias espaçados.

Mas a falta de tempo dos pais pode levar à desistência ou ao uso do castigo, que não funciona a longo prazo. “Não recomendamos isso de maneira alguma, porque se você fala para seu filho que se ele não comer tal alimento não vai brincar, por exemplo, ele pode reverter a situação e fazer uma chantagem, pedindo algo em troca para se alimentar”, explica Anna Carolina.

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De filho para pai

Existe um consenso entre nutricionistas e professores de que o hábito alimentar vem de casa, mas a escola hoje é fundamental na hora de consolidar o que é saudável ou transformar o que está errado, atingindo inclusive os pais. Se­­gundo a Diretora do Colégio No­vo Ateneu, Vera Julião, as crianças levam muito a sério o que o professor fala e isso se reflete quando estão com a família, pois ensinam os próprios pais. “É curioso ver que quando pai e mãe não mudam de comportamento e mandam lanches não saudáveis, as outras crianças repreendem o colega e cobram dele que coma o que a professora diz fazer bem à saúde”, afirma.

No mesmo colégio os pais podem, se agendarem com antecedência, almoçar com os filhos para saber o que eles comem. Sentam juntos à mesa, recebem a mesma bandeja de alimentos. Vera conta que as regras são iguais para todos e, que no começo do ano, eles bebiam suco durante o almoço, mas hoje sabem que faz mal à digestão e mudaram de comportamento. “Isso é apenas um dos exemplos de como a escola modifica o comportamento da família.”

Para os mais velhos, principalmente adolescentes, nem sempre a orientação das professoras funciona. A nutricionista da Escola Saint Michel Marcela Laufert Caran explica que para essa idade a preocupação com a aparência é grande, e o que faz com que eles mudem de hábito alimentar são o excesso de peso ou alguma doença que possa comprometer atividades que gostam de fazer.

Lucas Pavelski, 15 anos, descobriu que estava com o colesterol alto, conversou com a mãe, Valdeni da Silva Pavelki, e decidiram pedir ajuda à nutricionista da escola para orientar na dieta em casa e no colégio. “Antes eu dava dinheiro para ele comprar sanduíche e percebia que muitas vezes ele comia na panificadora da esquina. Hoje ele leva lanche de casa que eu preparo de acordo com o que ela me ensinou e com o que ele aprendeu lá. Quase todo dia tem água de coco com algum biscoito integral”, conta a mãe.

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Mão na massa

Ir à cozinha para aprender. Esta é a lição dada em algumas escolas de Curitiba para facilitar a conscientização sobre alimentação saudável. As professoras levam as crianças ao local onde é preparado o lanche e enquanto elas ajudam a nutricionista, recebem orientações e entendem porque é importante comer aquela verdura que parece tão ruim.

A nutricionista do Colégio Dom Bosco, Lúcia Tetti, conta que os pe­­quenos preparam uma vez por semana salada de frutas, suco, salada de verduras, sopa e modelam bolinhos com açúcar mascavo, um ingrediente novo para a maioria dos alunos. “Quando en­­­tram em contato com o alimento que preparam sen­­­tem mais vontade de degustar, inclusive aquilo que não conhecem. Então fica mais fácil apresentar sabores até então desconhecidos. Elas rejeitam menos. Sem contar que é uma grande diversão para os alunos, porque é uma atividade que foge da rotina”.

Além de noções alimentares os estudantes têm também reforço de Matemática e Português, pois as receitas envolvem noções de leitura e interpretação de texto, assim como cálculos matemáticos simples. A diretora de educação infantil da mesma escola, Maria Lúcia Cas­tellano, conta que antes de irem à co­zinha, os alunos têm em sala lições sobre as consequências de uma má alimentação. “Ten­tamos incluir o assunto nos planos de aula pelo menos uma vez por semana, seja na jardinagem, educação física ou ciências.”

Na Escola Umbrella a aula de culinária também acontece, mas existe outra forma de incentivar as crianças a comerem alimentos saudáveis. Duas vezes por semana elas fazem um piquenique no bosque da escola e os professores sentam junto para comer e conversar. “Muitos alunos seguem o comportamento do professor. Se ele come algo diferente e diz que é bom, os outros vão querer experimentar”, explica a coordenadora da educação infantil da escola, Anna Caro­lina Jordan. Mas, se ainda houver resistência dos estudantes ela trabalha com formas lúdicas, como cortar os alimentos em formato de figuras ou enfeitar pratos e copos.

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